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O livro "The Big Necessity", da jornalista britânica Rose George, escrito em 2008, fala de um tema que, infelizmente, continua a preocupar todo o mundo: como nos diz a autora, "fala de porcaria". Sim, hoje vou falar-vos de cocó e da importância da sanita.
Em pleno século XXI, milhões de pessoas não têm acesso a uma sanita. Quando não há sanita, onde é que se faz cocó? Na rua, provavelmente junto das fontes de água e alimento, causando incalculáveis mortes e doenças através da contaminação. Quantas imagens já viram como esta?
Estas crianças e todos os adultos que com elas vivem fazem cocó todos os dias, ao ar livre, sem qualquer balde, caixa ou "buraco" que recebam as ditas fezes.
O pior é que o cocó transporta passageiros. Sabiam que mais de 50 doenças gostam de passear no cocó humano?
O sintoma mais comun associado a este "transporte de merda humana" de um lado para o outro, é a diarreia. Todos os dias morrem milhares de crianças e adultos devido à diarreia, sendo mesmo a segunda causa de morte infantil no mundo.
Falamos e preocupamo-nos com o HIV, com a tuberculose ou até com o sarampo. Pois é, a diarreia mata mais do que estas três doenças em conjunto. "A diarreia é uma potente arma de destruição maciça".
Neste livro, a autora lembra como o saneamento foi eleito por mais de 11.000 médicos e cientistas como o maior avanço médico desde 1840, num concurso realizado pelo British Medical Journal, em 2007. Tratar o esgoto salvou milhões de vidas, vencendo concorrentes como os antibióticos e as vacinas. Rose George não brinca quando diz que “devíamos venerar a sanita”. Ela pode não curar doenças, mas faz algo ainda melhor, evita que fiquemos doentes.
Ter sanita deveria ser um direito mas, em quase metade do mundo, parece que é um privilégio.
Neste livro, a autora dá vários exemplos de como está o saneamento no mundo.
No Paquistão, por exemplo, todos os anos morrem 150 mil crianças devido às deficientes condições de higiene. Contudo, este país gasta 47 vezes mais em forças armadas do que em saneamento.
Na Índia, 25% das meninas desistem da escola por não terem sanita. Alguém as pode incriminar? Como será estar menstruada e ter que fazer "todo o serviço" na rua, "a céu aberto"? Na TED que estive a ouvir desta autora, e que aconselho vivamente (ver AQUI) fala-nos também de uma campanha na Índia, que visa a obrigatoriedade de uma sanita para que as mulheres aceitem um pedido de casamento. A campanha tem o nome "Sem retrete eu não aceito".
Rose George fala ainda numa outra perspectiva, de como o cocó pode ser uma fonte inesgotável de combustível. Será que está a ser aproveitado como tal? Parece que não...
Sabemos que mudar o comportamento humano não é nada fácil mas, perante este problema vergonhoso, será que não vale a pena investir no saneamento, considerando-o a principal prioridade do mundo?
Vou acabar este post a fazer o mesmo pedido que a autora deste livro: "Não tenham vergonha de falar de cocó!" Talvez com muitas conversas à volta do tema, se consiga "manipular a emoção humana" e evitar que tantas crianças continuem a morrer todos os dias de diarreia ou cólera.